Amigos, estivemos com actividades que dizem respeito ao Plano Nacional de Leitura. Lemos um livro de Luísa Ducla Soares, recomendado para o 1º ano de escolaridade, destinado a leitura orientada na sala de aula.
Ilustração: José |
Era uma vez uma galinha que todos os dias punha um ovo. E todos os dias vinha a dona, com uma cestinha, tirar-lho.
- Já pus 1000 ovos. Podia ser mãe de mil filhos. Mas não tenho nenhum por causa da gente gulosa. – cacarejou certa manhã a galinha. – Vou fugir.
Se bem o pensou, melhor o fez. Quando a dona entrou na capoeira, como de costume, esgueirou-se pela porta aberta. Só parou na mata.
Logo aí tratou de fazer o seu ninho com folhas secas, palhas, penugem, farrapos de lã. Nunca se vira ninho mais lindo, redondo, confortável. Sentou-se nele e pôs um ovo muito branquinho.
- Vou encher a barriga antes de começar a chocar, que aqui ninguém me traz de comer. – resolveu a galinha, afastando-se em busca de almoço.
Demorou-se, porque ali tudo lhe era estranho.
Quando voltou, qual não foi o seu espanto ao ver o ninho cheio de ovos de todos os tamanhos e feitios.
- Cocorocó… Que vem a ser isto? – disse ela. – Na minha capoeira tiravam-me os ovos, aqui oferecem- -mos. Mas que sorte.
E logo se aninhou.
Daí por diante, a galinha mal saía do choco. Estava preguiçosa, sentia o corpo quente como uma botija.
O tempo foi passando. Quanto, não sabia, porque não aprendera a contar nem se guiava pelo calendário.
Até que…crac! O primeiro ovo estalou e de lá saiu um bicharoco de bico retorcido.
- Ai, mas que filho,
eu até desmaio!
Em vez de ser pinto
é um papagaio.
- exclamou a galinha.
No dia seguinte, outro ovo se abriu e de lá saiu, rastejando, uma criatura comprida e sarapintada.
Ai, mas que filho,
como ele é diferente!
Em vez de ser pinto
é uma serpente.
- exclamou a galinha.
Nessa mesma tarde, o maior de todos os ovos partiu-se ao meio. A galinha espreitou, desconfiada. Ao ver o que tinha à sua frente, pôs-se a cacarejar:
Ai, mas que filho,
este é de truz!
Em vez de ser pinto
é uma avestruz.
Faltavam ainda dois ovos. Que esconderiam lá dentro! A galinha curiosa, picou um deles. Mas ai caindo para o lado.
Ai, mas que filho!
Deve vir do Nilo!
Em vez de ser pinto
é um crocodilo.
Ainda se não tinha calado quando sentiu um reboliço no último.
Ao ver uma penugem amarela, bateu as asas de contentamento e escancarou o bico:
Ai, mas que filho!
Diz o meu instinto
que este finalmente
é mesmo um pinto.
- Olhem a minha ninhada! – mostrava ela às galinhas do mato. – É tão variada, é tão engraçada.
- Trata só do teu pinto. Não ligues aos outros bichos. – aconselhava a perdiz.
Mas como podia ela abandoná-los depois de os ter chocado com tanto amor? Que outra mãe havia de tratar deles?
Era feliz, mas vivia num desassossego.
O papagaio voava para as árvores e ela não sabia voar.
O crocodilo só estava bem dentro de água e ela não sabia nadar.
A serpente metia-se por todos os buracos e ela era gorda demais para a poder ir buscar.
A avestruz, essa, devorava tudo, não havia comida que lhe chegasse.
Só o pinto, naturalmente, se portava como um pinto.
Mas ela de todos gostava. De todos cuidava.
Colocava a serpente quando ela tinha cócegas, porque à pobrezinha faltavam as patas.
Enrouquecia de tanto tagarelar com o papagaio, que queria sempre conversa.
Cansava-se a carregar petiscos para a comilona da avestruz.
Esgravatava o chão em busca de sementes para o pinto.
E nos intervalos levava as dentuças ao crocodilo.
Tudo parecia correr bem até que apareceu no bosque um rapaz.
- Ah, que belo frango! – disse ele, ao ver o filho verdadeiro da galinha. . -Vou assá-lo para o jantar.
- Cocorococó – refilou a galinha, o que quer dizer na sua língua «Não lhe toques, senão pico-te».
O rapaz riu. Pois, quem tem medo de uma galinha? E apanhou o frango.
Foi então que a serpente, ao ver o que se passava, se pôs a assobiar à sua frente, mostrando os dentes de veneno.
- Ai, uma serpente! – gritou ele e atirou-se ao lago para lhe escapar.
Foi a vez de o crocodilo avançar de boca aberta.
- Ai, que este me come! – gritou novamente o rapaz, subindo para a outra margem, sempre com o frango debaixo do braço.
Aí estava o papagaio, empoleirado numa árvore:
És ladrão, és ladrão,
vou prender-te na prisão!
És ladrão, és ladrão,
vou prender-te na prisão!
- Um polícia… - assustou-se o moço. – Deixa-me fugir.
Mas logo atrás de si começou a ouvir uns passos, primeiro distantes, depois cada vez mais próximos. A grande velocidade. Era a avestruz. Apavorado, pensando que um polícia o perseguia, o rapaz largou a ave e só parou, esbaforido, na aldeia.
Às costas da irmã avestruz, o frango voltou para casa. Para festejar, a galinha juntou todos os filhos e fez-lhes um bolo com vários andares.
Um tinha milho para o frango.
Outro, peixe para o crocodilo.
Outro, fruta para o papagaio.
Outro, ratos para a serpente.
E por cima, a enfeitar, sete berlindes, um martelo e vinte pregos, porque a avestruz só gostava de pitéus extravagantes.
Depois do jantar, os filhos fizeram uma roda à volta da galinha e puseram-se a cantar:
Somos todos irmãos,
somos todos diferentes:
há uns que têm bico,
outros que têm dentes,
há uns que têm escamas,
outros que têm asas,
na terra e na água
fazemos nossas casas.
Eu só tenho pescoço.
Eu voo pelo ar.
Eu nado a quatro patas.
Eu cá gosto de andar.
Somos todos diferentes
mas todos queremos bem
à boa galinha
que é nossa mãe.
Luísa Ducla Soares
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